Como o presidente eleito virou o melhor porta-voz na COP 27 para a questão mais relevante do mundo
por Alexandre Mansur, diretor do Instituto O Mundo Que Queremos e coordenador da campanha Amazônia no Centro*
“O Brasil está de volta ao mundo”. Respire e leia mais uma vez: o Brasil está de volta ao mundo. Foi com esta frase que o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva se consolidou como a liderança mais aguardada — e celebrada — na COP 27, na cidade de Sharm el-Sheikh, no Egito, onde representantes de cerca de 200 países estiveram reunidos até esta sexta-feira (18). Embora ainda não tenha sido empossado, Lula participou do encontro com honras de chefe de Estado, a convite do presidente do país africano e do governador do Pará, Helder Barbalho, representante dos governadores do Consórcio Amazônia Legal, e sua presença deixou o público em polvorosa. E isso tudo tem um motivo.
Depois de quatro anos sob a gestão de um governo negacionista, o Brasil volta ao palco principal das discussões e reassume a postura de líder internacional nas negociações do clima global, já que sempre foi o representante dos países em desenvolvimento e o responsável por fazer ponte com os países desenvolvidos. A retomada dessas capacidades técnica e diplomática, que são natas, era aguardada por todo o mundo com muita ansiedade para fortalecer o processo de preservação do clima do planeta. Mas a chegada — ou o retorno — de Lula foi mais do que isso.
O Lula que foi eleito agora é diferente do Lula dos dois primeiros mandatos. Esse novo Lula incorporou muito bem a mensagem de pesquisadores em relação ao combate às mudanças climáticas e entendeu que reduzir o desmatamento na Amazônia é o melhor caminho para gerar desenvolvimento social e econômico, isto é, garantir comida no prato dos brasileiros, gerar empregos e reduzir as desigualdades que assolam o país. O Lula de agora entendeu que defender uma agenda climática de transição para a economia de baixo carbono é um jeito de posicionar o Brasil como competidor no cenário internacional e, claro, uma maneira de atrair recursos e investimentos no mercado internacional.
Ou seja, o Brasil finalmente terá um presidente que compreendeu que combater as mudanças climáticas é, também, combater a fome, a miséria e a pobreza — não à toa, as principais bandeiras de Lula e causas às quais dedica a vida a combater, ainda mais por ter nascido em uma região do Nordeste atingida por secas, provavelmente, ligadas às mudanças climáticas. Por essas razões, ele se tornou o porta-voz da justiça climática, que nada mais é do desenvolver ações para impedir que os mais vulneráveis — populações atingidas pela falta de comida e de água, e mais expostas à violência, desigualdade social e racial, e a eventos extremos, como desabamentos, enchentes e secas — sejam os mais afetados pelo aquecimento global.
É preciso dizer, ainda, que a justiça climática é o espaço para dar voz a quem, até há pouco tempo, não tinha. A ativista negra Amanda Costa, fundadora do Instituto Perifa Sustentável, é um exemplo disso. Em entrevista recente, ela disse que sua geração quer trabalhar em empregos que estejam realmente comprometidos com o desenvolvimento sustentável, políticas climáticas e antirracistas. Para isso, acrescentou, é necessário ter empregos verdes em territórios vulneráveis, investimentos nas periferias e implementação da justiça climática para os mais afetados, que são os povos indígenas, quilombolas, ribeirinhos, pretos e periféricos.
Com isso, fica claro que será impossível avançar no combate às mudanças climáticas enquanto essa for uma discussão distante da realidade das pessoas. É urgente conversar com quem já está sendo prejudicado com a crise do clima e que, paradoxalmente, é a parte da população que tem menos responsabilidade nesse processo. Em outras palavras, falar de justiça climática é um jeito de trazer para o debate a massa da população, que é quem decide quais são as pautas importantes para o país pelo poder de voto. É igualmente urgente convencer essas pessoas que combater as mudanças climáticas é lutar para melhorar a vida de todos.
No fim das contas, isso vai gerar apoio popular e político para o povo brasileiro se movimentar para onde deve ir, que é se firmar como liderança global no combate às mudanças climáticas. Essa é a hora da mudança.
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