por Gabriella Dorlhiac*
A COP26, Cúpula Climática da ONU, terminou em Glasgow no dia 12 de novembro do ano passado com um grande suspiro de alívio para os participantes e a comunidade internacional. Apesar de uma mudança não ideal no texto do acordo no último segundo, a Presidência da COP nas mãos dos britânicos havia conseguido finalizar o Artigo 6 do Acordo de Paris, abrindo caminho principalmente para um mercado regulado de carbono.
O Brasil deixou Glasgow tendo trabalhado para reverter a percepção da comunidade internacional de que não era um país comprometido com o Meio Ambiente e com o combate à mudança climática. Assinou vários acordos, entre eles o “Compromisso Global de Metano”, que prevê a redução de 30% nas emissões do segundo maior poluente após o gás carbônico até 2030 e o compromisso para combate ao desflorestamento.
Já estamos quase no meio de 2022 e, em seis meses, teremos a COP27, sediada pelo Egito e que está sendo vista como a COP dos resultados. Quanto efetivamente avançamos nos compromissos e na agenda climática para apresentarmos à comunidade internacional? Me refiro não apenas ao Brasil, mas ao resto dos países também.
Começamos o ano com aumento de casos de COVID, aumento da inflação em todo o mundo e agora vivemos mais de dois meses de conflito armado desde a invasão da Ucrânia pela Rússia. Conflito este que ameaça deflagrar uma crise alimentar de grande escala uma vez que Rússia e Ucrânia são importantes fornecedores de fertilizantes (juntos respondem por 28% das exportações) e trigo (ambos os países respondem por 30% da produção global).
Com os preços de combustíveis e alimentos subindo dramaticamente, com as atenções da comunidade internacional voltadas para resolução de um conflito armado sem horizonte para terminar e de grandes repercussões geopolíticas, há um temor real de que o comprometimento e a implementação dos compromissos assumidos fique em segundo ou terceiro plano.
Nosso papel como setor privado e formadores de opinião é não deixar a pauta no escanteio, mas, sim, refletir como, dentro desse cenário ainda mais desafiador, podemos equacionar um momento econômico delicado com os avanços em outra pauta tão importante para o futuro de todos nós.
Vale lembrar que, quando o assunto é o futuro do Brasil em termos de comércio internacional, tivemos, no início do ano, sinais bastante positivos da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) em relação a uma possível acessão do Brasil. Esse importante passo exige, também, uma adequação do País a uma série de questões associadas à preservação ambiental. Além de fazer a lição de casa, teremos de deixar claro que não transigimos com práticas que venham na contramão desse assunto.
No Brasil teremos eleições presidencial e legislativa no final do ano. É essencial que o tema da sustentabilidade seja amplamente discutido pelas campanhas. Nosso foco deve ser que país queremos ser, como vamos elevar a barra para nós mesmos.
A temática verde é uma pauta de forte desenvolvimento econômico. Se olharmos apenas para o mercado de carbono, temos um potencial sem comparação com qualquer outro país. De acordo com estudo da ICC com a WayCarbon, o Brasil pode ser responsável por cerca de 20% dos créditos de carbono no mercado regulado. Ao todo, poderíamos gerar cerca de 100 bilhões de dólares até 2030 e criar cerca de 8 milhões de empregos, além de outros vários cobenefícios.
Esses benefícios só se materializarão se efetivamente continuarmos a demandar de todos os envolvidos um avanço na implementação do que acordamos em 2021. A atual crise certamente eleva os desafios, mas, dentro deste novo cenário, precisamos pensar em que efetivamente podemos implementar e como a pauta verde pode ser uma solução para sair da crise atual, e não uma barreira.
O que não podemos fazer é chegar em Sharm El-Sheikh, no Egito, sem qualquer tipo de progresso concreto nessa pauta.
* Diretora-executiva da ICC Brasil, Câmara de Comércio Internacional
Foto: Depositphotos