O governo federal deve registrar um déficit primário de R$ 247,2 bilhões em 2021. Para os próximos anos, as projeções não são animadoras: rombos de R$ 170,47 bilhões em 2022, R$ 144,97 bilhões em 2023 R$ 102,2 em 2024. Nesse cenário, a revisão dos gastos públicos é de suma importância. Parte do déficit decorre dos bilhões de reais em subsídios concedidos pelo governo federal para diversos setores. Em 2019, o total de benesses somou R$ 348,3 bilhões, que corresponderam a cerca de 5% do PIB do ano. Desse montante, quase 90% foram isenções tributárias.
Pode-se argumentar que alguns desses subsídios geram externalidades positivas. De fato. Ao reduzir impostos para setores como energia renovável, por exemplo, o governo incentiva o desenvolvimento de novas tecnologias e a adoção de fontes limpas.
Subsidiando a ineficiência
Dentro desse cenário, há diversas distorções. Uma delas: o país dá tratamento tributário privilegiado para geladeiras com alto consumo de energia como se elas fossem mais eficientes do que são. Sim. O Brasil está incentivando a produção de geladeiras com tecnologias consideradas defasadas por países desenvolvidos.
Explica-se: O Inmetro classifica equipamentos que consomem energia por meio de etiquetas com letras e cores. Os produtos com consumo mais eficiente estão na categoria A. O problema é que a última revisão dos parâmetros de classificação ocorreu em 2006, como é o caso de geladeiras. De lá para cá, a tecnologia avançou e existem equipamentos mais eficientes – mas a classificação do Inmetro não mudou. Ou seja, produtos ineficientes recebem o selo A no Brasil. Em países avançados, seja Estados Unidos ou na Europa, os produtos que recebem classificação máxima são muito mais eficientes.
E onde isso afeta os cofres públicos?
Desde 2009, as geladeiras na categoria A têm redução no Imposto de Produtos Industrializados (IPI) – de 15% para 10%. O subsídio foi criado para incentivar o consumo de produtos mais eficientes energeticamente. Na prática, grande parte das geladeiras vendidas no Brasil estão enquadradas no melhor nível de eficiência, sendo que a indústria tem tecnologias mais avançadas.
Segundo cálculos da CLASP e IEI, a falta de atualização da classificação pode custar R$ 33 bilhões aos cofres públicos até 2030.
A Rede Kigali, composta pelo Instituto Clima e Sociedade (iCS), Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), entre outros, lidera campanha para que o Inmetro adote os critérios mínimos do Energy Star, um padrão internacional de eficiência criado nos Estados Unidos – e sem adoção de graus subníveis dentro da categoria A (A+, A++, A+++). A ideia é que haja apenas faixas de A até C, D ou E.
Para se ter uma ideia do impacto da mudança: se todas as geladeiras no Brasil tivessem o nível de eficiência pretendido, o consumo de energia seria de 18,7 TWh, suficiente para abastecer 10,2 milhões de residências, 15% do total. Para as famílias, a economia seria de quase R$ 14 bilhões.
Indústria mais inovadora
A atualização da classificação, além de restabelecer a justiça tributária, incentiva a indústria a inovar em tecnologias mais eficientes, aumentando a competitividade do setor. A baixa eficiência das geladeiras produzidas no Brasil impede que elas sejam vendidas na Europa, Estados Unidos, México, Índia e Quênia.
No final da década de 90, o México copiou os padrões de eficiência dos EUA, induzindo a indústria local à modernização. Resultado: aumento de nove vezes nas exportações de geladeiras, de US$ 401 milhões em 2000 para US$ 3,7 bilhões em 2014.